14.4.11

Dei tudo o que eu queria receber, esperando um troco considerável. Fechei algumas janelas, fiz limonada, liguei a TV e acomodei-a no sofá rodeada com almofadas, tudo pra entregar o mundo que eu queria pra mim. Toquei em assuntos doces, mostrei segredos jamais vistos, jeitos e trejeitos ocultos que pertenciam só a mim. Aí, eis que um dia fiquei doente, era eu quem precisava de sopa e cobertor e o que me rendeu ? Um comprimido. Foi alguma coisa, me ajudou, óbvio. Mas, não era o que eu esperava, queria algo mais do que um compilado artificial de alguma substancia, queria calor e afeto. Deixei pra lá, mas no outro dia não fiz a limonada, sou sentimental demais pra isso, minhas feições apesar de saudáveis ainda demonstravam insatisfação. Rejeição e ingratidão são intragáveis, não descem nem com água com açúcar.
Outra vez, uma febre me atordoou, mais forte que a última, fiquei lá esperando a redenção, a retratação do erro cometido, mas no buraco que ficou foi colocado um bloco de reincidência. Aí foi a gota d’água. Gritei,esperneei, os vizinhos ouviam e então vi uma sombra se afastando gradativamente, ia como se fosse pra sempre. Sentei, chorei e pensei: não haveria como continuar. Estava sozinha, tudo que tinha, dei. Todos os outros, dispensei. E agora ?
Os dias passaram, ninguém no meu sofá, ninguém pra contar. Agora era mesa pra um. Não suportei, fui as ruas procurando seguir os passos deixados. Encontrei-a debaixo de uma árvore no meio do caminho, tranqüila e festejando. Redimi-me, pelo ataque, mas não estava atrás disso, queria declarações de como havia sido difícil sem mim também, queria gratidão, mas no lugar do esperado vieram acusações malvadas. Além de acusações havia provas, eu não era capaz de enxergar, só via quem compadecesse de verdade do crime. Na minha atitude passional resolvi ignorar, Tapei os ouvidos dei um sorriso e me dei por ‘satisfeita’ mas era tarde demais. Aquelas frases ecoavam na minha mente, batiam, voltavam e se reverberavam pelo meu crânio, não podia compactuar com uma coisa a qual não fazia sentido pra mim. Se agindo de boa índole fui tão mal interpretada, o que me resta esperar? Que um dia quando eu falar das flores vai pensar que eu estou com inveja dos perfumes e da beleza outra vez quando eu falar do que eu já vivi vais achar que eu quero ser superior e quando eu rir com uma brincadeira de correr vai achar que tudo pra mim é competição. Voltei atrás, desfiz o sorriso e tomei meu rumo pensativa, dizendo pra mim:
- Não, te aquieta coração. Carrega teu fardo a sós, acostuma-te com o silencio e com não ter com quem compartilhar, guarda mais pra si. Lugar pra um, por favor. Quem não é capaz de interpretar sua bondade tão pouco és merecedor de tua devoção. Começa de novo, mesmo sem ter a quem dar a mão e seja feliz.

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desapegar   v. tr. 1.  Despegar. 2.  Fazer perder a afeição a. v. pron. 3.  Perder a afeição a. 4.  Perder o interesse, o e...